quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Viagem ao Centro da Terra e a cultura indígena Macuxi

Viagem ao Centro da Terra, publicado em 1884, por Júlio Verne, é um marco da literatura de ficção científica. Nele, o Prof. Lindenbrok e seu sobrinho Axel chegam ao centro do planeta pela cratera de um vulcão.

A teoria da Terra Oca, defendida séculos atrás por estudiosos, mas hoje refutada pela Ciência, está presente como mito em diferentes culturas. Segundo vários textos facilmente encontráveis na internet, o povo indígena Macuxi é um deles.

Os Macuxi teriam sido os guardiões do submundo, até serem punidos pelos gigantes do interior da Terra: aqueles não teriam conseguido evitar que os exploradores europeus invadissem as cavernas da Amazônia em busca de ouro e diamantes, no começo do século XX.

Nas entranhas da Terra, segundo esses relatos, além dos gigantes, haveria lanternas, pedras e riachos de ebulição, árvores, frutas e peixes gigantes. Para chegar lá, era preciso caminhar durante semanas, além de ser possível flutuar pelo caminho.


Viagem ao Centro da Terra, de Júlio Verne, não retrata nada disso. Mas tem oceano, ilha e nuvens subterrâneos, além de dinossauros, outros animais pré-históricos e homens das cavernas. Provavelmente, o autor não teve contato com histórias Macuxi, restritas à tradição oral. Nem por isso deixa de ser um excelente livro. Não à toa entrou para a história da literatura mundial.

VERNE, Júlio. Viagem ao centro da terra. São Paulo: Martin Claret, 2004.

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sábado, 18 de novembro de 2017

Patachu, o personagem que inspirou o Pequeno Príncipe

Um garoto puro a fazer perguntas desconcertantes a um adulto ocupado com as coisas práticas da vida, além de referências a estrelas, carneiro, caixa, focinheira, rosa, raposa, deserto e poço. De que livro francês se trata? Provavelmente, você pensou em O Pequeno Príncipe (1942), de Saint-Exupéry. Mas os mesmos elementos são encontrados em Patachu, Pequeno Menino (1929), de Tristan Derème, morto em 1941, personagem não tão ilustre quanto seu “conterrâneo”, um dos mais famosos da literatura infantojuvenil.

Essas coincidências levaram o escritor e ensaísta francês Denis Boissier a propor a hipótese de que Patachu inspirou a criação do Pequeno Príncipe. As histórias de Patachu (Patachou, no original, em francês) foram publicadas em 1927 na revista Le Divan, mais tarde no jornal Le Figaro e em forma de livro em 1929. No Brasil, foram editados recentemente os livros O Pequeno Patachu e Mais Histórias do Pequeno Patachu, pela Editora Piu.

O próprio Denis Boissier afirma que não há prova conclusiva de que sua hipótese esteja correta. Ainda que esteja, isso não faz de O Pequeno Príncipe um plágio. Exupéry, ao se inspirar em Derème, se o fez, criou uma obra única, que, não por acaso até hoje encanta crianças e pessoas mais velhas, entre elas, candidatas a miss.

Patachu é um garoto francês de seis anos, o Pequeno Príncipe é um extraterrestre, príncipe e única pessoa a morar em seu planeta distante e desconhecido. Patachu mora no interior da França, o Pequeno Príncipe visita planetas. Patachu interage com o tio, o Pequeno Príncipe conversa com um aviador, mas também com flores, uma cobra e uma raposa, que lhe diz: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.


Quer saber se Patachu inspirou o Pequeno Príncipe? Leia-os. Mas quer saber mesmo? Espero que, ao final, sua única certeza seja a de que esses dois pequenos são gigantes, por fazerem você se lembrar da criança que já foi um dia.

Para ler O Pequeno Príncipe (em português), em domínio público desde 2015, acesse aqui.

É possível adquirir os livros do Pequeno Patachu no site da Editora Piu.

Para ler o artigo 'Saint-Exupéry e Tristan Derème: a origem do pequeno príncipe' (em português), de Denis Boissier, acesse aqui.

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sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Conselhos para uma Boa Vista da cultura

Quando Boa Vista aderiu ao Sistema Nacional de Cultura, em dezembro de 2012, já na Gestão Teresa Surita, o município comprometia-se ali, entre outras medidas, a criar o Conselho Municipal de Políticas Culturais. Sem ele e sem um fundo e um plano de cultura, o município não pode receber recursos do Fundo Nacional de Cultura. Com isso, perdemos todos.

Todavia, não basta a criação e o funcionamento de um conselho de qualquer jeito. É preciso que esse mecanismo seja criado e lhe sejam proporcionadas condições para que cumpra seu papel: a definição de políticas públicas para a cultura de Boa Vista, com efetiva participação da sociedade civil.

É necessário aprender com os erros e acertos de conselhos criados em outras esferas da administração pública e unidades federativas. Um formato interessante e que poderia ser adequado à realidade local é o do Conselho Nacional de Políticas Culturais (CNPC), que, além da representação governamental, tem 17 representantes da sociedade civil, dos segmentos artísticos, de áreas técnicas, como arquitetura e urbanismo, e de cultura e povos tradicionais.

Além disso, é fundamental que o conselho seja deliberativo e paritário, com poder de decisão e mesmo número de vagas distribuídas entre o governo e a sociedade civil. Os representantes desta devem ser eleitos pela própria população. Da mesma forma, os representantes governamentais devem ser nomeados para tanto por terem perfil de gestão no âmbito da cultura, com experiência em política participativa e abertura para o diálogo.

Não há mais espaço para conselhos decorativos, que somente chancelam as decisões do executivo. Comum entre as décadas de 60 e 80 do século passado, outra composição a ser evitada é o conselho de notáveis, personalidades individuais de destaque na vida intelectual e artística, mas que, segundo Lia Calabre, “provoca um significativo distanciamento entre as reais necessidades e demandas do conjunto da comunidade e os projetos de cultura submetidos à apreciação”. Doutora em História Social, Lia Calabre já foi presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa.

Boa Vista poderia ainda se inspirar no CNPC e adotar os colegiados setoriais, órgãos cuja competência é discutir e acompanhar as políticas públicas de cada um dos segmentos do conselho nacional. Cada colegiado é formado por representantes governamentais e do respectivo segmento, o que amplia a participação da sociedade civil e garante um espaço de debate qualificado e especializado sobre os diferentes segmentos artístico-culturais.

Por fim, um dispositivo a se levar em consideração é a alternância na presidência do conselho entre representantes do governo e da sociedade civil, inciativa bem-sucedida em órgãos colegiados como o Conselho Nacional de Juventude.

Qualquer que seja o formato do conselho de cultura de Boa Vista, este deve ser fruto de um amplo debate com a participação efetiva da sociedade civil. A contribuição histórica dada recentemente pelos militantes da cultura na audiência pública na Câmara Municipal sobre o orçamento de Boa Vista é uma prova da força, da disposição e da qualificada contribuição que estes podem dar à definição de políticas culturais do município.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Pela primeira vez, Roraima é finalista do mais importante prêmio da literatura brasileira

Foram dois escritores roraimenses indicados: Cristino Wapichana e Ina Carolina

Roraima recebeu duas indicações no 59º Prêmio Jabuti, ambas obras voltadas ao público infantil. Pelo que se tem notícia, esta é primeira vez que o Estado tem, ao menos, um finalista no prêmio considerado o mais importante da literatura brasileira.

O livro ‘A boca da noite’, de Cristino Wapichana, foi indicado na categoria Infantil. ‘Kidsbook Itaú Criança’, da também roraimense Ina Carolina, em coautoria com outros escritores, foi indicado na categoria Infantil Digital. Os demais autores de ‘Kidsbook Itaú Criança’ são: Marcelo Rubens Paiva e Alexandre Rampazo, Luis Fernando Verissimo e Willian Santiago, Fernanda Takai, Adriana Carranca e Brunna Mancuso, Antonio Prata e Caio Bucaretchi. Atualmente, Cristino Wapichana e Ina Carolina moram em São Paulo.

Até então, o único registro que se tem de Roraima no Prêmio Jabuti foi em 2015 com o livro acadêmico ‘Agricultura Conservacionista no Brasil’, segundo lugar na categoria Ciências da Natureza, Meio Ambiente e Matemática. Um dos artigos que compõe a obra é de autoria do professor e pesquisador da UFRR Valdinar Ferreira Melo. Entretanto, o professor não é considerado pelo prêmio como autor do livro, organizado por Luiz Fernando Carvalho Leite, Giovana Alcântara Maciel e Ademir Sérgio Ferreira de Araújo.

Cristino Wapichana e Ina Carolina.
Crédito: acervo Jaime Brasil Filho

Leia também:
O nascimento de um conto ou como pari ‘Teu Futuro te Condena’ 

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Ode a Ana Maria é fantástico 
O Homem de Barlovento: um tesouro oculto 
Resenha: Daniel Sapeca e o Diamante Azul do Tepequém (Clotilho Filgueiras) 

Resenha: Rapadura é doce, mas não é mole (José Vilela)

domingo, 8 de outubro de 2017

O nascimento de um conto ou como pari ‘Teu Futuro te Condena’


Como vagas ideias literárias de um adolescente se transformaram, mais de quinze anos depois, em um conto publicado em antologia organizada pelo maior escritor brasileiro de terror da atualidade?

Antes de explicar, é bom esclarecer que este texto não tem a pretensão de funcionar como uma espécie de manual. Mas, se ajudar escritores iniciantes a escreverem melhor suas histórias, nada mal, hein!


‘Teu Futuro te Condena’ é um conto escrito ali por 2016. Cheguei a ele a partir de três ideias diferentes, algumas separadas das outras por mais de uma década.


Na minha adolescência, quando me sentia poeta, e não me aventurava pela prosa, propus a mim mesmo dois desafios literários: 1) escrever uma história em segunda pessoa; 2) e outra narrada no futuro.


Por quê? Queria fugir do mais do mesmo, depois de perceber que a esmagadora maioria das histórias são narradas em primeira ou terceira pessoa e no passado ou no presente.


Exemplo 1: “Quando ouvi detalhes das crueldades e derramamentos de sangue que indivíduos ou nações impunham uns aos outros, não pude conter meu sentimento de revolta.” (Frankenstein, de Mary Shelley). Primeira pessoa (eu). Passado.  


Exemplo 2: “Desce o menino a montanha, atravessa o mundo todo, chega ao grande rio, com as mãos recolhe quanta de água lá cabia, volta o mundo atravessar, pelo monte se arrasta, três gotas que lá chegaram, bebeu-as a flor com sede.” (A Maior Flor do Mundo, de José Saramago). Terceira pessoa (ele). Presente.


Voltando ao processo de construção de ‘Teu Futuro te Condena’, muito tempo depois, ali por 2015, 2016, veio a terceira ideia: uma história de profecia autorrealizável, em que o próprio ato de dizer quem alguém será o torna aquilo. Seria uma crítica ao modo como a sociedade lida com a criminalidade. Tenho um projeto de escrever uma antologia de contos sobre violência, segurança, encarceramento, etc., mas isso já é outra história.


Bem, decidi juntar as três ideias na mesma história: imaginei uma cigana, um oráculo ou algo do tipo lendo o futuro de um recém-nascido (“Tu serás um assassino”) e essa profecia faria com que todos o tratassem, desde sempre, como o assassino que a profecia dizia que ele se tornaria. Daí, nasceu ‘Teu Futuro te Condena’.


Que lições tirar disso? Planeje o que vai escrever. Não dependa só da inspiração. Anote e não descarte suas ideias só porque não consegue transformá-las em uma história de imediato. Retorne a elas, de tempos em tempos, para ver se consegue enxergá-las com outros olhos. Proponha-se desafios. Fuja do comum: busque escrever o que ninguém jamais disse ou diga de modo inovador aquilo já repetido tantas vezes. E depois, é só aproveitar as oportunidades que aparecem...


Ah, faltou dizer que não sou escritor de histórias sombrias. Então, para escrever ‘Teu Futuro te Condena’, precisei sair da minha zona de conforto. 

A Antologia Sombria, organizada por André Vianco, e que selecionou este e outros contos será lançado em São Paulo (SP), no dia 28 de outubro de 2017.  Para saber mais, clique aqui.

Até lá, você pode ler o trecho inicial do conto:


"— Serás um assassino — dir-te-ei, recém-nascido, quando teus pais te trouxerem até mim.

Lerei teu futuro, como o de todos os paridos naquela hedionda cidade, em uma porção do meu sangue. Descreverei em detalhes a teus genitores que, com um instrumento perfurocortante de fabricação caseira, vazarás os olhos de uma mulher de cabelos brancos e dela cortarás o pescoço. Ainda permanecerás ao seu lado, vendo-a sangrar em silêncio até a morte."




PIMENTEL, Aldenor. Teu futuro te condena. In: VIANCO, André. Antologia sombria. São Paulo: Empíreo, 2017. 

Para ler, outros textos literários de Aldenor Pimentel, clique aqui.

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